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terça-feira, fevereiro 16, 2010

Advogados

Retalhos da vida de um advogado de província, verídicos e relatados na 1ª pessoa, pelo Sr. Dr. Prates Miguel, Il. Causídico da Região, no seu livro "Desaforos",recheado de pequenas histórias, algumas verdadeiramente hilariantes como, por exemplo, estas que se seguem e que espero contribuam para a boa-disposição de todos:

O RETRATO

Pelos meus apontamentos, corria o ano de 1988.

Há bem pouco tempo que o marido se finara e porque herdeiros menores havia, ela, viúva enlutada da cabeça aos pés (que até os brincos retirara aos lóbulos das orelhas agora cingidos pelo lenço preto...), balbuciava declarações de cabeça-de-casal no processo de Inventário Obrigatório.
Terminado o auto e restituindo-lhe o Bilhete de Identidade, o escrivão advertiu-a de que teria de ir renovar o documento uma vez que no mesmo constava como sendo casada e, afinal, agora já era viúva.
Para tanto, que se dirigisse ao Registo Civil e fosse portadora de fotografias suas, mas, atenção...a cores... porque agora com a CEE era obrigatório retrato colorido no cartão.
Ficou estarrecida.
E gemeu:
- Então, com o meu homem enterrado vai para dois meses, o Tribunal obriga-me a vestir de cor para tirar o retrato?! Deus me perdoe!

PERGUNTA PERTINENTE

Na sala de audiências à cunha, eram julgados por um crime hediondo, réus acusados de assalto a residência e homicídio de velhotes que a habitavam, em lugarejo próximo da vila.
A justiça contava com a ciência de três juízes e a consciência dos jurados seleccionados por sorteio entre os cidadãos recenseados e inscritos nos cadernos eleitorais das várias freguesias do concelho como era de Lei.
Terminadas as instâncias pelos advogados, o Presidente do Colectivo sempre incitava ao esclarecimento na outra bancada:
- Algum dos Senhores Jurados quer fazer perguntas?
Não. Durante horas e horas, por parte dos Jurados, sempre moita-carrasco!
Todavia, o juiz Presidente não desarmou no seu ritual escrupuloso e apelativo.
Cobriam-se as paredes fronteiras já de sombras precoces e o Magistrado insistia:
- Algum dos Senhores Jurados quer fazer perguntas?
Levantou-se então a camponesa, madura, Jurada por sorteio e toda a assistência conteve a respiração.
Sem papas na língua, aconchegando o lenço de ramagens floridas ao carrapito, escancarando os lábios à revelação do único dente incisivo pendurado no maxilar superior, assim falou:
- Eu quero perguntar quando é que isto acaba porque são quase horas da camioneta da carreira e depois já não tenho transporte para minha casa...

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